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segunda-feira, outubro 31, 2005


Balada de Amor



Canto:
P’ra ti que inventaste o amor
Com a voz, a palavra e o gesto
Que o procuras e vais onde mora
Que sabes conservá-lo e mantê-lo
Durante toda a vida, a cada hora

Canto:
P’ra nós que vivemos um amor
Apenas breve tempo mas intenso
Enchendo-nos de gozo e de alegria
Retendo-o um minuto, tempo imenso
De Paz, de Prazer e de Harmonia


Choro:
Por vós que não sabeis amar
Matais o sonho, recalcais o grito
Suprema felicidade de um momento
Não guardais em vossas almas nem a voz
Do Prazer, da Alegria ou de um Lamento






Zica Caldeira Cabral
1988-01-05

sexta-feira, outubro 28, 2005


Obrigado



Não tenho pressa, amor
Nem preciso de tempo
Tenho toda a eternidade
Dentro de mim
Para te agradecer
O tempo não tem fim

Obrigado
Por toda a vida que puzeste em mim
Por tudo o que disseste
E que eu gostei de ouvir
Por toda a ternura
Que os teus gestos transmitiram

Obrigado
Por mil sensações que me fizeste sentir
Porque permitiste que crescesse
Obrigado

Obrigado
Porque resolveste conflitos sem saber
Porque permitiste que eu desse
Sem querer receber
Por tudo isto e muito mais
Que eu nem sei dizer
Obrigado

Não tenho pressa, amor
Eu faço o tempo
Que corre doce
Quando estás ao pé de mim
E te posso dizer
Que o tempo não tem fim

Zica Caldeira Cabral

1987-03-04

quarta-feira, outubro 26, 2005


Sonhos


Povoada de sonhos, irrealidades
Pisando um chão feito de luar
Os meus passos flutuam no infinito
Nem paro para pensar
No Amor que me assola
Me toma
Me enche e preenche
Piso nuvens que se desfazem
Vejo-te no céu
No horizonte distante
No ouro avermelhado
Do pôr do Sol
No mar imenso
Na espuma
Da onda que morre
Na minha almofada
Beijo os teus olhos
As tuas mãos que tocam
Meus sentidos
O teu corpo morno
De prazer
Estendo-me a teu lado
E vibro intensamente
Numa ilusão eterna
De ter encontrado
O que há tanto
Tinha perdido



26-10-05
Zica Caldeira Cabral

segunda-feira, outubro 24, 2005

Serra da Estrela ainda com neve

Saudades
11 – 04 - 2001


Deitada sob um carvalho
Poiso o meu olhar cansado
No verde calmo das ervas
Nas pedras fofas de musgo
Ouvindo o cantar das águas
Do ribeirinho que corre
Desfolhando um malmequer
Olho p’rás nuvens do céu

Beira Alta pedregosa
Imolada pelo fogo
Que queima a alma da Serra
Tira a riqueza do povo

No silêncio desta tarde
Sinto o vento a murmurar
Ao agitar a folhagem
A mosca zumbe ao passar
O Sol quente queima o solo
E a água fresca ao correr
Amortece o meu cansaço
Desta luta de viver

Beira Alta tão amada
Das férias da minha infância
Do cheiro a terra molhada
Das pinhas e dos pinhões
Das lembranças coloridas
Dos pic-nics na Serra
E das horas divertidas
Brincando com meus irmãos


Zica Caldeira Cabral

sexta-feira, outubro 21, 2005

BRASIL
Viagens e descobertas
02-04-2001


Céu azul e sol de fogo
Mar aberto à descoberta
Cada onda tem inscrito
O nome dos marinheiros
Numa viagem incerta

Partiram sem nada ter
Sem nada saber da vida
A alma cheia de esperanças
Olhos fundos de respeito
Na bagagem as lembranças

Dura tarefa o navio
O cansaço vence o medo
Não tarda a hora chegar
De descobrir no olhar
Terra branca e arvoredo

Deram-lhe o nome Brasil
Um nome de árvore dura
Acharam um mundo novo
Queriam descobrir a Índia
E inventaram um povo

Zica Caldeira Cabral
Este post é dedicado a uma brasileira que muito admiro chamada Flavia, veterinária de profissão e que tem o blog Missisclof

sábado, outubro 15, 2005




Palavras

10-10-2005

É a inquietação mas a ternura
Que as palavras que surgem vão gritando
Caindo firmes, doces, generosas
Que ávidas mãos vão agarrando


Na pele macia roçam, desmaiadas
E ao ser tocadas ficam transparentes
E em mil cores e perfumes se desfazem
A alma adormecendo docemente


E nessas mãos abertas, sequiosas
Como flores retendo a Primavera
As tuas palavras doces generosas
Puseram fim a uma longa espera





Zica Caldeira Cabral

quarta-feira, outubro 12, 2005


Algumas considerações acerca da espécie humana



Na Natureza, a única especie que se mata e tortura a si própria e a outras é a espécie humana. Ter prazer com o sofriemento alheio é só apanágio do Homem.
Sabemos que, os chimpazés, normalmente vegetarianos organizam caçadas a outras espécies - os babuinos, por exemplo – para ritualizar a sua sociabilidade. É importante estabelecer e fixar hierarquias e a caça, com a respectiva partilha da presa, vai demontrar ao grupo quem é quem naquela micro sociedade.
Todas as sociedades naturais têm uma estrutura hierarquizada à volta da qual se organizam. Umas são mais complexas como as dos lobos, ratos, ratazanas, formigas e abelhas, por exemplo, outras mais simples, constituidas apenas por uma familia monoparental. Ou seja, animais que não vivendo em grandes grupos não necessitam de estruturas sociais tão complexas. A maioria dos ursos estão neste contexto.

A especie humana, dita civilizada, tem vindo a criar estruturas sociais tão complexas que se tornaram disfuncionais e precárias.
Ainda há sociedades humanas que vivem de acordo com os principios do continuum natural, cujas regras de sociabilidade são adaptadas ao meio ambiente onde vivem e que hajem de acordo com ele. São já raras, porém e, infelizmente, têm tendência a desaparecer.

A imposição de regras sociais cada vez mais desfazadas da realidade natural, a destruição sistemática dos nichos ecológicos com a respectiva diversidade de espécies, acabaram por destas afastar o Homem, fazendo-o acreditar ao mesmo tempo na sua superioridade. Daí resultar o desiquilibrio fisico e psiquico que leva a humanidade a excessos cujo o resultado é o seu proprio extermínio.
Poder-me-ía alongar em exemplos mas, infelizmente, todos nós os temos presentes. Guerras, crimes, violações, genocídios, escravidão da sua e de outras especies e, muito recentemente a destruição sitematizada de jovens, crianças e adolescentes através do tráfico de drogas que alteram a personalidade e destroem o cérebro.
Esta é a parte negra da sociedade humana.

No entanto, embora isto seja uma realidade cada vez mais pálpavel , ou até por causa disso, há, também, o reverso da medalha.
Os sentimentos positivos e a consciência de que sem eles a espécie humana será condenada.
A bondade, o amor incondicional, a necessidade de pertencermos a um todo harmonioso, de termos um papel a desempenhar na sociedade natural, de que nenhuma espécie é mais importante do que outra na cadeia ecológica. O respeito pela vida, a protecção e defesa dos mais fracos.

Só com valores como estes poderemos sobreviver como espécie no meio das outras todas, correndo o risco, de no caso de imperarem os outros valores acima mencionados, sermos, lamentavelmente, uma especie em vias de extinção.


Zica Caldeira Cabral

Diz sim à vida



Diz sim ao Homem
Que ama todas as cores
Que não destroi
Nem trai sua cidade
Diz sim ao Homem
Que ama a Natureza
Faz parte dela
Preserva sua beleza

Diz sim ao parque
Onde vais passear
Diz sim ao Mar
Cheio de golfinhos
Diz sim à terra
Onde brota o trigo
Diz sim ao ar
Cheio de passarinhos

Diz sim à Paz
Feita de alegria
Diz não à droga
Que é destruição
Que faz as guerras
Mutila crianças
Diz sim à vida
Não escolhas a solidão

Amar é bom
E é tão bom viver
Diz sim à vida
Tens muito que fazer
Zica Caldeira Cabral
05 - 10 - 2000

terça-feira, outubro 11, 2005


MAR

Se no mundo interior do teu ser
Procurares o mais belo de ti

Seguirás uma luz
Que te leva a um mar
Onde múltiplas cores tu verás

É o verde das folhas de esperança
O azul do horizonte sem fim

O vermelho do fogo
O amarelo do Sol
O negro da noite, a prata do luar

E nas ondas revoltas da vida
Sentirás o medo de a enfrentar

Se venceres essas ondas
Irás encontrar
O infinito prazer de viver




Zica Caldeira Cabral 09-02-2001
Este poema e o anterior que coloquei no blog, assim como outros que irei pôr, fazem parte de uma serie de canções para crianças que resolvi compôr e que ensinava aos meus alunos de 6 a9/10 anos.
Dedico este post a todos os meus alunos do Bambi, do Restauração , do Mundo Portugues e do Externato Paula Vicente e a todas a crianças em geral para que façam um Mundo melhor no futuro. Eu tenho tentado através da musica educar as crianças no sentido da preservação da Natureza e entreajuda das especies

segunda-feira, outubro 10, 2005


Renascer
No mundo inteiro eu vi
Crianças a brincar
Vi sonhos, vi surpresas
Vi estrelas a brilhar

Vi árvores a crescer
E pássaros no ar
Senti a neve fria
E mergulhei no mar

Pergunto agora
Se tudo o que tive
Vai desaparecer

Se o pôr – do - sol
Volta a encher de luz
O resto do dia

Estão a estragar a Natureza
O que temos já não presta
Quem te embalará depois

Vem construir a nova Terra
Limpar lagos e florestas
E cuidar dos animais

No mundo inteiro eu vi
Zica Caldeira Cabral
25-01-2001

domingo, outubro 09, 2005



A um viajante



Vieste de mansinho
Insinuante
Com passinhos curtos
Mas seguros
Transportavas palavras
E sorrisos
Imagens que tocaram
Meus sentidos
Embalaste ideiais
Coração grande
Que ao abrir-se
Tocou tambem o meu
Prendeste o meu destino
Nos teus braços
Fizeste acreditar
Ao mais descrente
Que o Amor ainda
Não morreu


Zica Caldeira Cabral 09/10/05

Torto (conclusão)

Torto (conclusão)


Um dia, viu na livraria um documento com o Selo Real e começou a preparar o plano que engendrara. Copiou-o, desenhou-o num molde mas, precisava da forja para poder fazer uma réplica. Durante dois meses ía à forja de noite, sem ser visto e assim consegui fazer a cópia perfeita do Selo Real. Agora só tinha que espera o momento mais propício.

A oportunidade chegou quando o seu Senhor o mandou a um Castelo ben distante, a 5 dias de viagem. A meio do caminho, parando para dormir numa aldeia perdida nas montanhas, Fernão poude mandar a mensagem Real que forjara. O Rei pedia ao nobre D. Gastão o seu auxílio e participação na nova Cruzada que partira já há dois meses para Jerusalem. Deveria partir sem demora.


Vestindo uma tunica dos Templarios e tapando a cara, Fernão deu umas moedas a um pobre camponês qpra que fosse entregar a mensagem ao Castelo. Sabia que, quando o homem chegasse ao seu destino já ele estaria no outroe que não seria provavel que o ligassem ao Cavaleiro Templário que entregara a missiva. Ninguém lhe vira a cara, entrara naquela aldeia ao anoitecer e saira ainda a madrugada não havia despontado.
Permaneceu no Castelo , cumprindo a tarefa que lhe tinham pedido. Tinha que organizar toda a escrita e organização, repartir tarefas entre os servos e mandar reparar os estragos que o tempo fizera, no Castelo. O desleixo do antigo Senhor daquelas terras deixara as propriedades ao Deus dará e a má administração ameaçava a ruina . O filho que as herdara agora, recem casado, queria pôr em pé o que a incuria do Pai quase fizera perder.
Sabendo da competencia do Intendente de D. Gastão perdira-o emprestado para que organizasse tudo. Fernão ficaria ali o tempo que fosse preciso.




Aguardou, sereno, o resultado da sua missiva. Sabia que o seu Senhor não partiria para a Terra Santa sem se despedir e vir recomendar os seus. E estava certo.
Uma semana depois, D. Gastão apareceu e contou-lhhe da carta que recebera e do pedido formal do Rei que não podia recusar. Recomendou-lhe que olhasse pelos seus eque, assim que finalizasse as tarefas naquele Castelo , regressasse imediatamente.
- Senhor – disse Fernão – esperarei ansioso a Vossa chegada e não vos preocupeis pois Vossa Mãe e irmãos ficarão em segurança comigo. Darei a minha vida por eles. A minha missão aqui está ternminada e partirei imediatamente.
Permiti, porém, que vos acompanhe até ao fim da floresta. É escura e perigosa e não quero que nada vos aconteça.
- Está certo Fernão, confio em ti para que zeles pela minha família.

E partiram sem pressas para dentro daquela floresta tenebrosa que escondia a mais mortal das armadilhas.
Inconsciente so perigo que corria, D. Gastão falava com o Intendente, dando-lhe as instruções necessarias em relação aos assuntos da familia.
Deveria acompanhar sempre a Senhora sua Mãe nas visitas que fazia e cuidar para que os seus irmãozinhos estudassem com Frei Bento e não descurassem os treinos com as armas e os cavalos.
Rodrigo, com 10 anos, estava pronto para entrar como pagem ao serviço do Principe Herdeiro. Quanto a Sebastião, o segundo com 7 anos e a pequena Isolda de 4, nascida já após seu Pai ter morrido, deveria vigiar para que fossem educados, humildes e obedientes aos peceitos da Santa Igreja e da sociedade.

Chegaram a meio da floresta cerrada e escura como breu, ao sitio onde nem os raios de sol conseguiam penetrar. Deixando-se ficar um pouco mais para trás, Fernão arremessou o machado que tinha preso à cinta, contra a cabeça do Nobre que caiu do cavalo sem sentidos. Arrastou-o então par a funda cova a qual encheu de terra ,. No fim arrastou com a ajuda dos cavalos duas enormes pedras que colocou por cima da tumba do seu Senhor. Por precaução, matou o cavalo do Amo para que nunca aparecesse tambem. Não queria que o cavalo lhe estragasse os planos chamando a atenção para o desaparecimento do seu Senhor. Regressou calmamente ao Castelo e, aos poucos, foi-se tornando indispensável aquela Mãe tão só.



Passaram-se 3 anos sem qualquer noticia do Nobre. Fernão tornara-se Senhor do Casleo. Insinuara-se de tal forma qque se tornara querido não só da Senhora mas dos filhos e de Frei Bento. Um dia, atrevera-se a pedir a mão de D. Branca que, com o apoio e benção de Frei Bento aceitara deleitada. Não houve qualquer impediemnto pois as falsas raízes de nobreza que fora inventado ao longos daqueles anos, eliminaram o abismo social que os separava.
Nunca dedicou, sequer, um pensamente ao seu crime, achanso sempre que os meios justificavam os seus fins. Não tinha escrúpulos do que tinha feito pois assim realizara os seus sonhos de riqueza.
E acabou os seus dias como queria no luxo e na riqueza com uma aura de respeitabilidade que nunca merecera.


Zica Caldeira Cabral.

quinta-feira, outubro 06, 2005



Dentro das muralhas do Castelo, erguido numa posição estratégica, no cimo do monte, vivia uma pequena população formada pelos servos e por artifices que davam apoio à manutenção do mesmo. Havia um ferreiro, um oleiro, um vidreiro, uma padaria que fornecia o pão às cozinhas e aos trabalhadores, internos e externos, um cesteiro que além de fazer os cestos e peneiras, fazia, tb, os telhados de colmo das casinhas que se erguiam dentro das muralhas onde viviam os artífices.
O aparecimento de um novo criado despertou a curiosidade de todos e aos poucos tentaram aproximar-se para conhecer aquele estranho em quem o Amo parecia tanto confiar.
Torto podia ter ensinado muito ao ferrador, por exemplo, pois era jovem e enexperiente, porém, nunca quiz confraternizar com nenhum artífice ou trabalhador, mantendo uma rigida postura à parte. Não admitia que ninguém lhe chamassem “Torto” e passou a utilizar o seu nome proprio, Fernão.

Do alto da torre de menagem a vista, para Sul, estendia-se até ao mar englobando a cidadezinha que nele se banhava e dele vivia. Para Norte, eram campos cultivados com cereais e productos horticulas e florestas cheias de caça e um grande lago cheio de peixe que fornecia o Castelo e os servos e, segundo o seu Senhor lhe dissera aquelas terras e todos os camponeses pertenciam a sua Mãe, a ele e aos irmãos. Tudo tinha um ar ordenado e tratado e parecia que, sob a administração daquela familia todos os que a serviam eram felizes. Se algum camponês adoecia era logo mandado o físico do Castelo para o tratar e as crianças brincavam e corriam felizes e saudaveis ao pé dos seus pais.

Todos os dias, após realizar os seus deveres de criado/escudeiro, “Torto” ía para uma sala enorme, com duas mesas corridas, cadeiras e as paredes forradas de prateleiras cheias de livros. Chamavam-lhe a Livraria e era lá que Frei Bento o ensinava. Ao principio tudo era uma confusão, nem era tanto a leitura mas a escrita, complicada e cheia de arabescos. Mas sabia que era importante para os seus planosde alcançar uma vida diferente. E a poucos, quase nenhuns, camponeses era dada a oportunidade de aprender a escrever e a ler. Ao fim de alguns meses “Torto” já dominava, perfeitamente, a leitura e começou a ionteressar-se pelos muitos livrosque o rodeavam. Pediu licença ao Senhor para os ler e ele, contente, concedeu-lha de imediato.
- Estou orgulhoso de ti – disse-lhe – tudo o que quizeres lêr está ao teu dispôr.
E aos poucos foi-se cultivando, aprendendo tudo o que podia e, ganhando mais e mais a confiança do Nobre.

Dois anos se passaram e foi feito Intendente do Castelo. O seu feitio desconfiado e agreste suavizou-se e já não parecia o rude camponês sujo de fuligem que seguira D. Gastão. Aprendeu a falar com a Senhora como um verdadeiro fidalgo. Com o cargo de Intendente tinha contacto com outros Intendentes, administradores e fidalgos ,vassalos do seu Senhor.E a ambição turvou-lhe as ideias. Porque não apoderár-se de tudo o que a sua vista alcançava? Era preciso pensar e planear. Finalmente o seu mau caracter que nunca tinha desaparecido, a inveja, o despeito e o orgulho excessivo vinham ao de cima depois destes dois anos de os silenciar. Para todos era o Intendente simpático, honesto,que tinha sempre uma boa palavra para todos. No fundo era um homem cruel que não olhva a meios para alcançar os seus fins.
A Senhora ainda era muito nova e bonita e os 3 filhos menores precisavam de um Pai, pensou. D. Gastão estava ao serviço do Rei e poderia ser chamado para outra Cruzada. Não poderia recusar.
Mas “Torto” – agora já só lhe chamavam por seu nome , Fernão - tinha que pensar em todos os pormenores. Não podia haver falhas.

O primeiro grande obstáculo era a sua origem servil. Sabia muito bem que nobres só se casam com nobres e ainda mais com a fortuna que estes tinham.
Começou, discretamente, por inventar uma história romântica à cerca do seu nascimento. Seus pais, nobres de nascimento tinham sido assaltados por salteadores quando faziam uma viagem sem escolta. Ele tinha sido raptado em bébé e tinham-no deixado naquela aldeia onde crescera e encontrara o seu Senhor. Duas velhotas tinham-no recolhido com a promessa dos salteadores de lhes darem dinheiro porque seus pais eram muito ricos. Mas como os homens nunca mais parecessem as velhotas lá se condoeram da criança e, mal ou bem criaram-no até morrerem ambas quando ele tinha 12 anos. Entrara ao servilço do Ferreiro da aldeia e lá ficara por falta de melhores oportunidades
E ía acrescentando pormenores consuante a imaginação do momento. Mas o principal tópico , a nobreza do seu sangue, estava sempre latente nas versões que contava. Em cada encontro com nobres vizinhosou seus intendentes, Fernão ía-se insinuando e sedimentava as suas falsas raízes.

segunda-feira, outubro 03, 2005


Torto I



Na aldeia chamavam-lhe “o Torto”, nao porque tivesse qualquer defeito fisico , simplesmente porque tinha mau feitio.Trabalhava numa forja, sempre suado e negro de fuligem. Ambicionava respirar outros ares, sentir-se limpo, bem vestido e ter uns sapatos. A pobreza em que vivia tornara-o azedo. Via o tempo a passar e nada se modificava nem conseguia imaginar uma forma de se livrar daquele buraco escuro e sujo onde passava os dias.
Um dia, um cavaleiro parou, apressado, a sua porta e ordenou-lhe que mudasse as ferraduras a sua montada. Tinha o cabelo aloirado, queimado pelo sol e a barba comprida e suja. Vestia uma cota de malha e, por cima, uma sobrecota com flores de lis , desbotada e já rota. Apesar do seu aspecto desleixado e sujo via-se que era um nobre. O cavalo trazia ainda a gualdrapa com os mesmos simbolos. O cavaleiro perguntou onde era a estalagem mais proxima e, à sua indicação, para lá se dirigiu afim de descansar e comer.
Ao fim de duas ou três horas regressou e examinou a montada:
- Muito bem camponês! Fizeste um bom trabalho! Davas-me geito se me acompanhasses. Tenho uma longa jornada a percorrer. Como te chamas?
- Chamo-me Fernão mas todos aqui me chamam “Torto”, Senhor – respondeu baixando os olhos.
- E queres vir comigo “Torto”? Tens aqui familia para dar sustento?
- Não Senhor , não tenho. Sou sózinho e irei com o voça mercê se me quizeredes.
- Nesse caso prepara-te porque parto ao alvorecer.
O “Torto” nem queria acreditar na sorte que lhe tinha caído assim de repente nas mãos. Sair dali e ganhar fortuna e fama servindo um cavaleiro nobre.


Pôs o capeirão aos ombros e cobriu a cabeça com o largo capuz pois caía uma morrinha. Enfiou no bornel um naco de pão e o resto do queijo que lhe sobrara do desjejum e apresentou-se ao fidalgo.
- Estou pronto Senhor. Que quereis que faça?
- Por hora nada, segue-me. Tens montada?
- Um macho de carga, Senhor.
- Muito bem, servir-te-à de montada e para transportar as provisões de que necessitamos.

A atitude humilde que adoptara era-lhe penosa. “Torto” era um homem orgulhoso que nunca baixara os olhos para ninguém mas, este fidalgo vindo do nada que lhe aparecera à porta, era o salvo conduto que precisava para sair dali e ser alguém. Teria que o servir por enquanto, mostrando-se útil e servil. Mas não seria para sempre, tinha a certeza.
Não sabia ainda se este jovem nobre era de posses ou simplesmente um filho de familia sem eira nem beira, aventureiro ou mercenário por conta de outro Senhor mas, sabia que a vida a seu lado seria bem melhor e com mais oportunidades que ali metido naquela forja.
Seguiu o seu novo Senhor perguntando-se o que iriam fazer?. Onde se dirigiam?. Mas manteve um silencio respeitoso. Um criado não faz perguntas, limita-se a obedecer. Não queria que o Senhor o dispensasse ao cabo de umas horas por lhe parecer arrogante. Queria ser-lhe , de tal maneira indispensável que o Nobre nunca mais o quizesse afastar.
Caminharam durante dois dias. O nobre, D. Gastão no seu cavalo árabe e “Torto” no seu macho, normalmente de tiro mas que se adaptara bem a ser montado. Chegaram a um porto e, de boca aberta e de olhos esbugalhados, “Torto” olhava aquela imensidão de água, num eterno movimento de vaivem que o fascinava mas assustava também. Será que o Senhor o vai obrigar a meter-se naquela água toda? E timidamente perguntou-lho.
Gastão deu uma gargalhada sonora.
- Nunca viste o mar “Torto”?. É grande e profundo. Se te metesses nele, sem saberes nadar, afogavas-te. Não, não quero que te molhes, sequer. Iremos de barco para um outro país. Lá tenho a minha família e a minha herança a receber.

A palavra “herança” sou aos ouvidos do antigo ferreiro como música. Riqueza! Ainda bem que o seu novo Senhor tinha de seu.....iria usufruir disso.
A viagem foi penosa, enjoou, quis morrer, desejou estar na sua forja outra vez , maldice a sua ambição por uma vida melhor. Antes o calor, a fuligem e a pobreza do que aquilo.
Mas tudo lhe passou quando, num Domingo, ao cabo de uma semana de sofrimento, aportaram numa pequena cidade, na encosta de um monte, no cimo do qual se erguia um castelo.
- É ali que vivo, com a minha santa Mãe e meus três irmãos mais novos. Meu Pai faleceu numa Cruzada há um ano atrás. Cabe-me a mim, prover agora pelo amparo dos que deixou.
- Pobre Senhora – disse o “Torto” com um ar de piedade fingida.
Na verdade não sentia pena nem preocupação. Os ricos e nobres tinham uma vida cheia de benesses enquanto os pobres tinham que penar a vida toda.
- Demonstras bons sentimentos “Torto”. És um homem piedoso e não te vais arrepender de me ter seguido. Preciso de um homem em quem possa confiar para me acompanhar o tempo todo, ou tratar dos meus assuntos na minha ausência. Serás util como ferrador mas, és inteligente, forte e saudavél. Aprenderás depressa outros oficios.
- Farei o que fôr preciso Senhor.
No dia seguinte D. Gastão chamou-o e apresentou-lhe o frade que vivia no castelo já há muitos anos.
- Este é Frei Bento, vai ensinar-te a ler, escrever e fazer contas. Se aprenderes depressa far-te-ei intendente do Castelo.
- Os números já os sei e fazer contas também mas as letras, foram sempre um misterio. Obrigado Senhor. É uma grande dádiva para mim e vou aproveitá-la.
(continua)